IBDFAM - Principais alterações da proposta do CCB sob a perspectiva notarial e registral
Autor:
Comissão notarial nacional do IBDFAM
A
COMISSÃO NOTARIAL NACIONAL DO IBDFAM, representada pela sua Presidente Priscila
Lopes Teixeira Agapito e seu Vice-Presidente Thomas Nosch Gonçalves, apresentam
um trabalho desenvolvido pela Comissão, com especial agradecimentos aos
notários que compõe a Comissão.Considerando
a redação da Relatoria-Geral, o presente artigo tem por objetivo apresentar em
caráter informativo as principais alterações da proposta, sob a perspectiva
notarial e registral, para toda comunidade extrajudicial, de sorte a permitir a
reflexão quanto aos possíveis impactos sobre as rotinas notariais. Assim, para
que não fique tão complexo, apresentamos de forma mais resumida os pontos de
maior interface com a atividade tabelioa.Parte Geral:É possível verificar nos primeiros artigos da proposta a
temática da personalidade internacional, constando-se a inclusão no sistema da
declaração de respeito a tratados internacionais, garantindo a todos os
sujeitos de direito a possibilidade de exercer direitos civis, reconhecendo e
garantindo-lhes esses direitos. Como se vê, o primeiro artigo tem impacto na
atividade notarial que poderá, por intermédio da plataforma do e-notariado,
materializar esses direitos de personalidade. No artigo 4º e 5º foram propostas mudanças para dar mais
roupagem jurídica às manifestações das crianças, que poderão expor vontades em
casos relacionados aos direitos de família, principalmente quando os pais não
concordarem entre si.Foi acrescido do termo "morte encefálica", no
art. 6º, que trata do fim da existência da pessoa natural, aproximando da Lei
9.434/97 e a Resolução Nº 2.173, de 23 de novembro de 2017, do Conselho Federal
de Medicina – CFM.No artigo 9º, houve uma hipertrofia do rol de atos
registrados no Registro Civil das Pessoas Naturais. Além disso, a eficácia
civil de direitos fundamentais abrange todos os objetos pertencentes à natureza
humana, suas essencialidades e potencialidades. Como se vê, foi expandido o
espectro para integrar todo tipo de relação jurídica, especialmente fruto da IV
Revolução Industrial.Aliás, isso desafiará ainda mais a atividade notarial, na
medida que deveremos nos preparar para formalização dos atos com essa
interface.Outra inclusão necessária que desafiará a
instrumentalização notarial é do artigo 83 na medida que consideram-se móveis
para os efeitos legais: IV - os conteúdos digitais dotados de valor econômico,
tornados disponíveis, independentemente do seu suporte material.Essa alteração vai reverberar na práxis notarial em todos
os atos que envolvam esses direitos “atuais”.Ainda sobre os bens, tivemos uma nova classificação dos
animais de estimação, nos termos artigo 91-A na qual os animais, objetos de
direito, são seres vivos sencientes e passíveis de proteção jurídica própria,
em virtude da sua natureza especial. A proteção jurídica prevista no caput será
regulada por lei especial, a qual disporá sobre o tratamento físico e ético
adequado aos animais; Até que sobrevenha lei especial, são aplicáveis,
subsidiariamente, aos animais as disposições relativas aos bens, desde que não
sejam, considerando a sua sensibilidade, incompatíveis com a sua natureza.Da relação afetiva, entre humanos e animais, pode derivar
legitimidade para a tutela correspondente de interesses, bem como pretensão
reparatória por danos experimentados por aqueles que desfrutam de sua
companhia[1].Destaque sobre o artigo 108, no qual foi proposta
modificação para que se exija escritura pública em toda relação que transmita
bens imóveis, não importando o valor, inserindo-se uma redução dos custos na
ordem de cinquenta por cento os emolumentos das escrituras públicas de negócios
que tenham por objeto imóvel com valor venal inferior a trinta vezes o maior
salário-mínimo vigente no País.
CONTRATOSNão poderíamos deixar de começar os comentários desta seção
abordando a possibilidade de os cônjuges renunciarem à herança deixada pelo
marido ou esposa ou companheiro em caso de morte. Hoje, a Justiça costuma
anular esse tipo de decisão. A renúncia à herança poderá vigorar em pacto
antenupcial ou em contrato de união estável. No Estado de São Paulo, o Conselho
Superior da Magistratura já decidiu pela invalidade destas disposições.Assim, caso a proposta ultrapasse todas as fases (jurídicas
e legislativas) será plenamente possível essa renúncia.O artigo 426 –Este artigo tem relevância substancial para a
atividade notarial, em especial, em seu parágrafo único (Parágrafo único. Não
são considerados contratos tendo por objeto herança de pessoa viva, os
negócios: I -firmados, em conjunto, entre herdeiros necessários, descendentes,
que disponham diretivas sobre colação de bens, excesso inoficioso, partilhas de
participações societárias, mesmo estando ainda vivo o ascendente comum; II -que
permitam aos nubentes, por pacto antenupcial ou convivencial, renunciar à
condição de herdeiro). Isto se dá na medida em que o inciso I reafirma prática
já usual na atividade, e o inciso II encerraria o debate pela não possibilidade
de se estabelecer, por pacto antenupcial, a renúncia da herança, fato este que
gera, na atualidade, um desconforto em toda a comunidade tabelioa, inclusive
com alguma jurisprudência administrativa sendo contrária a esta possibilidade.
Logo, seria uma mudança de paradigma.A natureza da convenção, por sua importância, exige a forma
pública. Neste sentido, a renúncia aos direitos hereditários em nosso sistema
atualmente já deve ser formalizada por escritura pública ou por termo dos autos
judiciais do inventário.Houve ampliação da liberdade contratual nos contratos
paritários e simétricos. Aliás, cabe uma ressalva aqui, seria recomendável a
instrumentalização por escritura pública em todos esses contratos, com expressa
participação plurilateral de advogados representantes aumentando assim, ainda
mais a paridade e segurança jurídica.Quanto à doação de cônjuge ao cúmplice, a comissão propôs a
revogação, com a qual o membro Flávio Tartuce concordou enquanto Rosa Nery
discordou. Os relatores propuseram que o prazo para ação anulatória será
contado do registro, ou da ciência anterior, o que ocorrer primeiro.Essa ciência ainda gera uma complexa prova, o que poderá
também ser provado por uma ata notarial de certificação. Vale lembrar que essa
sugestão não está inserida na proposta.Ainda sobre esses contratos simétricos e paritários, –a
Inclusão do parágrafo segundo (§2° A cláusula contratual que violar a função
social do contrato é nula de pleno direito) é de suma importância de modo a
deixar claro que cláusulas contrárias à função social do contrato, princípio
foco do novo modelo contratualista brasileiro, são nulas e não anuláveis.
Assim, as Escrituras Públicas seguem tais determinações e, portanto, cabe ao
notário uma verificação mais verticalizada dos dispositivos pleiteados pelas
partes no momento da confecção do ato notarial. Além disso, a edificação dos
ditames esculpidos nos arts. 421-A a 421-E reforçam o prisma de uma atuação
mais global, alicerçada nas novas bases principiológicas contratuais.Nas doações, tormentosa prova da inoficiosidade o artigo
549 altera de nulidade da parte excedente na doação inoficiosa para ineficaz.
Em sequência, em seus parágrafos, regula sobre os parâmetros para verificação
desta ineficacização. Houve no artigo 551 a inclusão de maneira expressa da
união estável de modo a ampliar a interpretação das doações conjuntivas e do
direito de acrescer. Porém, retiram a presunção do direito de acrescer, sendo
este apenas de modo expresso na Escritura Pública, seguindo a regra geral.Em relação ao mandato e seu instrumento, a procuração,
demanda recorrente em um tabelionato de notas, foi mantida a possibilidade de
substabelecimento por instrumento particular, ainda que se outorgue mandato por
instrumento público. Porém, restringe as hipóteses em que a forma pública não é
da substância do ato. Assim, diminuindo sobremaneira a possibilidade de
utilização deste instrumento fora do âmbito notarial. Ademais, deixou de forma
expressa a possibilidade de o mandatário concluir os negócios jurídicos
encetados já quitados em vida pelo mandante, ressaltando a sua não inclusão no
inventário e a promoção do denominado “alvará notarial”Direito das CoisasO artigo 1.227 estabelece que direitos reais sobre imóveis
constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem pelo
registro dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247) na circunscrição
imobiliária onde o bem se localiza, salvo os casos expressos neste Código. O
dispositivo trouxe um procedimento de notificação e eventual retificação.
Contudo, ainda não ficou muito claro como seria na prática essa situação, tendo
em vista que há previsões legais para alcançar aquele fim.A proposta do artigo 1.247 gera inúmeras nuances no
encadeamento notarial, na medida em que se o teor do registro não exprimir a
verdade, poderá o interessado postular que seja retificado ou cancelado. Não se
procederá ao cancelamento do registro de título aquisitivo irregular que possa
atingir direitos reais adquiridos onerosamente por terceiros de boa-fé, sem que
estes sejam ouvidos.Outrossim, não será considerado de boa-fé o terceiro que
comprovadamente tinha ciência da irregularidade do título. A aquisição do
terceiro de boa-fé não prevalecerá em face de direitos reais adquiridos,
independentemente do registro; e nas situações expressamente previstas em lei.Há inúmeros problemas neste artigo, especialmente por não
dialogar com a concentração da matrícula prevista no artigo 54 e parágrafos da
Lei 13.097/15.Por outro lado, a proposta do artigo 1247-A é muito feliz,
especialmente do civilista Flávio Tartuce, na medida em que a alienação de bem
imóvel feita por aquele que não é o seu proprietário é considerada ineficaz. Parágrafo
único. Nos termos deste artigo, ressalvam-se os direitos adquiridos de boa-fé.DIREITO DE FAMÍLIAA proposta do novo Código Civil traz a nomenclatura de
CONVIVENTES e não COMPANHEIROS. Foi incluída a possibilidade de união estável
dos menores entre 16 e 18 anos poderão a constituir, se emancipados ou
autorizados por seus representantes legais, sendo o registro facultativo mas,
se feito, altera o estado civil para o de conviventes. Destaca-se neste
ponto fortes argumentos críticos a essa alteração de estado de civil.Foi excluído no artigo 1564- E – o termo concubinato, mas o
texto proposto reconhece que se houve esforço comum deverá haver a partilha de
bens daqueles que estiverem impedidos de constituir família.Destaque para possível ata notarial, nos termos do artigo
1.571-A, ao passo que além de cessarem os deveres de fidelidade e coabitação, a
separação de corpos ou de fato cessam os efeitos decorrentes do regime de bensA comissão defende que a alteração do regime de bens dos
casamentos e uniões estáveis seja feita no cartório. Também poderá ser
realizado no cartório os pórcios, mesmo quando o casal tiver filhos menores
de 18 anos. Hoje, esse procedimento é feito no Judiciário. Outra situação que
poderá ser solucionada pelo notário é o pórcio unilateral em alguns casos -
por exemplo, quando há violência doméstica. Como se vê, houve uma valorização
da atuação extrajudicial. Nos termos do artigo 1.581, o pórcio pode ocorrer sem
prévia partilha de bens e o artigo 1.582-A, tratou do pórcio unilateral ou
dissolução de união estável requerido perante o RCPN. Será competente aquele em
que está registrada o casamento ou a união estável. Aqui, com toda vênia aos
relatores, deverá ser feita uma adequação que retrate melhor a situação, ou que
ainda, especifique apenas a dissolução conjugal SEM PARTILHA. Aliás, o próprio
CNJ já corrigiu anterior equívoco com relação às competências notariais e
registrais, fixando norma segundo a qual Registrador Civil não pode fazer
partilhas, nos termos de todo arcabouço jurídico, mesmo com o §6º definindo por
não poder cumular com o pedido de pórcio ou de dissolução da união estável
nenhuma outra pretensão, em especial, alimentos, arrolamento, guarda de filhos,
partilha de bens, ou medidas protetivas.Outrossim, o artigo 1.582-B – prescreve que o pórcio, a
dissolução da união estável, a partilha de bens, a guarda de filhos menores e
os alimentos em favor de ex-cônjuge, ex- convivente ou de filhos menores
poderão ser formalizados por escritura pública:§1º - dependerá de prévia aprovação do MP, se:I – cônjuge ou convivente incapaz;II- gravidez ou filho menor;III – guarda ou alimentos relativos à filho menor
§2º - manifestação prévia do MP no prazo de 15 dias e se
limita a fiscalizar os interesses do incapaz.
§3º - em caso de discordância do MP não poderá ser via
extrajudicial
Por outro lado, o artigo, 1.639 prevê a alteração de regime
de bens por intermédio de escritura pública. Seria recomendável a inclusão da
necessidade de apresentação de alguma certidão negativa? A título de exemplo:
certidões de feitos ajuizados e protesto. Assim, o tabelião ou o registrador
civil já poderiam comunicar tal circunstância, para averbação nos cadastros
necessários.Avançando um pouco mais, o artigo 1.778-A, tratou da
Diretiva Antecipada de Curatela, na qual vontade antecipada de curatela deverá
ser formalizada por escritura pública ou por instrumento particular autêntico.
Dessa maneira a práxis notarial denominada autocuratela que privilegia a
autodeterminação da pessoa, passa a ser considerada instituto jurídico autônomo
do Código Civil. O ato notarial de Diretiva Antecipada de Curatela poderá ou
não ser lavrado em Notas conjuntamente com as Diretivas Antecipadas de Vontade
(v. art. 15 da Redação Relatoria-Geral).Aliás, o próprio parágrafo único do Artigo 1.778-B defende
indiretamente a certeza e segurança jurídica da escritura pública.SucessõesO projeto de Novo Código Civil traz alterações profundas no
Livro V dedicado ao Direito das Sucessões. Algumas das mudanças propostas vão
ao encontro direto dos operadores do Direito, na medida em que afastam
problemas e confusões gerados pelas disposições do Código vigente.Uma das maiores novidades trazidas pelo projeto é a
relativa às disposições concernentes ao Direito Sucessório que diz respeito à
harmonia que se estabelece entre o Livro V e o Livro IV do Direito de Família.
Isto porque no atual sistema pátrio esses livros contêm disposições antagônicas
e regras conflitantes entre si.Curiosamente, uma das alterações que merece destaque não
está propriamente no Livro V do Direito das Sucessões mas sim no Livro I, na
parte relativa aos contratos. Isso porque, de acordo com o art. 426 do Código
Civil de 2002, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contrato. Essa
regra cogente sempre afastou a possibilidade de futuros cônjuges ou
companheiros renunciarem reciprocamente suas heranças em pactos antenupciais e
instrumentos de reconhecimento de união estável. Pelo atual sistema, ainda que
os futuros cônjuges ou companheiros optem pelo regime da separação absoluta de
bens, afastando qualquer comunicação patrimonial entre eles em vida, não
conseguem impedir esta comunicação e concorrência com outros herdeiros em sede
sucessória.O novo projeto de Código Civil conta com duas redações
distintas para resolver essa questão. De acordo com a proposta da jurista Rosa
Nery, “Não são considerados contratos tendo por objeto herança de pessoa viva,
os negócios: I - firmados, em conjunto, entre herdeiros necessários, descendentes,
que disponham diretivas sobre colação de bens, excesso inoficioso, partilhas de
participações societárias, mesmo estando ainda vivo o ascendente comum; II -
que permitam aos nubentes, por pacto antenupcial ou convivencial, renunciar à
condição de herdeiro”. Já o professor Tartuce propõe que: “Os cônjuges podem,
por meio de pacto antenupcial, e os conviventes, por meio de escritura pública
de união estável, renunciar reciprocamente à condição de herdeiro do outro
cônjuge ou companheiro; § 2º A renúncia pode ser condicionada às hipóteses de
concorrência com descendentes ou com ascendentes; § 3º A renúncia pode ser
condicionada, ainda, à sobrevivência ou não de parentes sucessíveis de qualquer
classe, bem como de outras pessoas, nos termos do artigo 1.829, não sendo
necessário que a condição seja recíproca”.Assim, de acordo com a redação proposta, a
incomunicabilidade patrimonial entre cônjuges é efetivada em vida durante a
constância do matrimônio ou união estável e também após o falecimento de qualquer
dos consortes.Outra proposta a merecer destaque diz respeito à inclusão
dos bens digitais do falecido como bens de valor economicamente apreciável que
integram a herança e que devem ser partilhados. São inseridas disposições de
proteção aos dados digitais do falecido e inclui-se a possibilidade de
escrituras públicas como títulos hábeis à regularização da titularidade dos
bens digitais junto às respectivas entidades controladoras das plataformas.Como é cediço, o direito à sucessão aberta, bem como o
quinhão de que disponha o co-herdeiro, podem ser objeto de cessão por escritura
pública (CC/2002, art. 1.793). O novo projeto amplia a possibilidade dessa
cessão para instrumentos particulares subscritos por duas testemunhas, o que
acaba por flexibilizar a segurança das relações jurídicas. Além disso, gera uma
inconsistência no sistema, uma vez que se teria de admitir como instrumento
válido dentro de uma escritura pública de arrolamento sumário e adjudicação,
por exemplo, um instrumento particular de cessão que carece dos mesmos
requisitos de segurança e aferição de identidade e capacidade daquela escritura
pública.O novo projeto cria ainda a possibilidade de uma escritura
pública de autorização para alienação de bens para a transferência de titularidade
de bens móveis de falecidos cujo valor não ultrapasse a 100 (cem) salários
mínimos, independentemente de inventário ou arrolamento. Essa medida vem de
encontro a uma problemática diária e flexibiliza a judicialização, na medida em
que oferece excelente alternativa extrajudicial ao alvará.Por outro lado, com relação à existência de herdeiros
incapazes o projeto pouco avança. Para situações em que há herdeiro incapaz e
total consenso entre cônjuge/companheiro e demais herdeiros, a jurisprudência
vem autorizando, expressamente, a lavratura de escrituras pública de inventário
e partilha extrajudiciais. Aliás, Corregedorias-gerais de alguns Estados
inclusive, já inseriram essa possibilidade em suas Normas de Serviço. O novo
projeto, entretanto, é tímido com relação a essa deferência e insiste na
judicialização da causa, mediante solicitação de alvará, com oitiva do
Ministério Público.De acordo com o artigo 1832 do Código Civil de 2002, em
concorrência com os descendentes, caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que
sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da
herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.A concorrência entre cônjuge e descendentes ou ascendentes
é eliminada pelo novo projeto de Código Civil. Todavia, a nova redação proposta
para o mencionado artigo 1832 causa estranheza pois dispõe que: “o herdeiro com
quem comprovadamente o dono da herança conviveu, e que não mediu esforços para
praticar atos de zelo e de cuidado em seu favor, durante os últimos tempos de
sua vida, se concorrer à herança com outros herdeiros, com quem disputa o
volume do acervo ou a forma de partilhá-lo: I - terá direito de ter
imediatamente, antes da partilha, destacado do montemor e disponibilizado para
sua posse e uso imediato, o valor correspondente a 10% (dez por cento) de sua
quota hereditária; II - se forem mais de um os herdeiros nas condições
previstas no caput deste artigo, igual direito lhes será garantido, nos termos
do §1º; III- se a herança não comportar as soluções previstas nos §§ 1º e 2º e
ela consistir apenas em único imóvel de morada do autor da herança, terão as
pessoas apontadas no caput deste artigo direito de ali manterem-se, com
exclusividade, a título de direito real de habitação.”. O que seria “que
não mediu esforços para praticar atos de zelo e de cuidado durante os últimos
tempos de vida...”? Quais atos são assim considerados? Quanto tempo antes do
falecimento pode ser enquadrado como últimos tempos de vida? A subjetividade na
aferição de critério para reserva de quinhão hereditário vai de encontro à
objetividade da igualdade constitucional e inevitavelmente implicará numa maior
litigância entre as partes que resolverão discutir e demonstrar a ocorrência ou
não de tais circunstâncias judicialmente. A esta altura, suscitar mais demandas
judiciais não parece assertivo e provavelmente não deve ter sido o intento do
proponente da redação.No tocante à ordem de vocação hereditária, o novo projeto
de Código Civil exclui a concorrência do cônjuge com descendentes ou
ascendentes, alocando-o apenas na terceira posição. Além disso, ele deixa de
ser herdeiro necessário. O regramento do projeto relativo à legítima fica um
pouco dúbio. Atualmente, de acordo com o art. 1.846 do Código vigente, pertence
aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança,
constituindo a legítima. Pela nova redação deste artigo, o testador, se quiser,
poderá destinar até um quarto da legítima a descendentes e ascendentes que
sejam considerados vulneráveis ou hipossuficientes. Não resta claro, assim, se
a legítima permanece como cinquenta por cento da herança ou se teria sido
reduzida para vinte e cinco por cento, ou se existe categoria de herdeiro
necessário, vulnerável e hipossuficiente a quem o quinhão atribuído de legítima
deva ser maior. Mais uma vez, critério subjetivos vão de encontro à
objetividade do Direito. Isso porque a condição do herdeiro vulnerável e
hipossuficiente, além de ser subjetiva, pode ser passageira, pois um herdeiro
que não preencha essa condição quando da lavratura do testamento pode ser nela
enquadrado quando da morte do testador, o que geraria um conflito nas
disposições testamentárias, ou até mesmo invalidade.Considerando-se que, pelo novo projeto o
cônjuge/companheiro não é mais herdeiro necessário, para exclui-lo da herança
basta que o testador o faça expressamente ou disponha de seu patrimônio sem o
contemplar. Aliás, como ressaltado inicialmente, este afastamento pode ter sido
realizado quando do pacto antenupcial, antes mesmo do casamento.No tocante ao testamento público, várias alterações foram
inseridas. O novo projeto, por exemplo, abre a possibilidade ao testador de
dispor acerca da legítima, podendo partilhá-la entre os herdeiros.Além disso, insere-se uma obrigação ao tabelião ou seu
substituto de gravação em sistema digital de som e imagem das declarações do
testador que será exibida a ele que confirmará, por escrito, seu teor.Por fim, inova o projeto ao trazer uma regra específica aos
hospitais, clínicas, asilos, casas de repouso ou a donos da residência em que
esteja pessoa que não possa se movimentar, ambular ou deslocar-se, que não
poderão impedir o ingresso de delagatários que venham praticar atos notariais
em suas dependências, cabendo ao tabelião, quando solicitado, identificar-se
perante o estabelecimento ou perante os donos da casa, declarando com precisão
quem os contatou e solicitou sua presença. Nesta oportunidade o tabelião
poderá, igualmente, realizar a gravação do corrido e das declarações tomadas.Outra inovação do texto, segundo Flávio Tartuce, foi o
livro de Direito Digital que provavelmente ficará localizado no final do novo
Código. Os relatores anunciaram a criação dos seguintes capítulos: Disposições
gerais; Pessoa no ambiente digital; Situações jurídicas; Direito ao ambiente
digital transparente e seguro; Patrimônio digital; Herança digital; Crianças e
adolescentes no ambiente digital; Inteligência artificial; Contratos digitais;
Assinaturas eletrônicas; Atas notariais eletrônicas.Nesse contexto, o artigo. 1.791-A, de fato se faz
necessária a alteração do Código Civil para abranger de modo expresso questões
relacionadas à vida digital, as quais, muitas vezes, no que se refere ao
aspecto patrimonial, possuem expressão muito superior às próprias coisas físicas.
Há perfis de redes sociais com expressivo valor econômico, entre outros
inúmeros exemplos que se poderiam ser citados. Já se partilhou entre herdeiros
uma conta do Instagram? É algo a se refletir, pois se trata de uma realidade.
Há contas na referida rede social que valem milhões de reais, e geram receitas
igualmente monumentais. Por outro lado, também acertada se mostra a decisão de
incluir a impossibilidade de se impedir que uma pessoa disponha sobre os
próprios dados, pois do contrário uma pessoa com existência real poderia ter
sua vida manipulada no meio digital para se tornar um “boneco” de si própria.
Exceto, evidentemente, no que se refere a dados de pouco impacto e que por sua
natureza possam sofrer restrição.Já no art. 1.791-B, também parece acertada a alteração
proposta pela Comissão, pois o acesso indiscriminado de qualquer pessoa, ainda
que por vínculo sanguíneo, forte, como o da própria filiação, pode ser motivo
de grande constrangimento. O falecido já não pode sentir o constrangimento, mas
a memória que as pessoas dele guardam deve ser protegida, incólume, pois o
juízo que a sociedade guarda de uma pessoa pode ser a própria essência daquilo
que o falecido buscou por toda uma vida.Ademais, foram apresentadas propostas de artigos tratando
do direito de desindexação e ao esquecimento, com a retirada de conteúdo
ofensivo a partir de alguns critérios e sem prejuízo da responsabilidade civil.Assim, verifica-se que o projeto de novo Código Civil
responde adequadamente a vários anseios dos comunidade jurídica no sentido de
dirimir conflitos existentes na legislação vigente.Sem a pretensão de afrontar a ínclita comissão de juristas
responsável pela proposta em comento, este grupo de trabalho, sob a batuta do
IBDFAM, no propósito de contribuir, apresenta algumas sugestões em âmbito
sucessório. Notadamente, no tocante à cessão de direitos hereditários por
instrumento particular, na forma proposta, poderá causar graves prejuízos às
partes e inviabilizar os inventários extrajudiciais, indo na contramão da
necessária desjudicialização.Além disso, o prazo para o exercício do direito de
preferência do coerdeiro, previsto no artigo 1795, começaria a contar do
registro da cessão ou da ciência do ato, o que ocorrer primeiro. Contudo, o
registro no Ofício Imobiliário da cessão de direitos hereditários é ato
controverso. Em muitos Estados, a cessão não é objeto de registro. Portanto, a
sugestão é que o prazo comece a fluir do registro do inventário.Outro ponto de suma importância que não foi enfrentado, foi
a impossibilidade de inventário extrajudicial quando houver incapazes: Não há
qualquer prejuízo aos incapazes se a partilha for igualitária, conforme a lei,
cada herdeiro recebendo a sua quota legítima em cada um dos bens. Ao contrário.
A partilha extrajudicial, sem necessidade de intervenção judicial, traz mais
celeridade ao procedimento e, de consequência, benefícios ao incapaz.O prazo de 2 anos do artigo 1.800, §4º (§ 4º Se, decorridos
dois anos da abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, ou
estabelecida a filiação, os bens reservados, salvo disposição em contrário do
testador, caberão aos herdeiros legítimos) parece estar em desacordo com o
prazo de 5 anos previsto no artigo 1.798, §1º (§ 1º. Somente é reconhecido
direito sucessório aos filhos gerados após a abertura da sucessão, se nascidos
no prazo de até 5 (cinco) anos a contar daquela data).Recomenda ainda a inclusão da nomeação de inventariante no
§2º, do artigo 1.805: §2º: O requerimento de abertura do inventário, a simples manifestação
nos autos, a nomeação prévia de inventariante por escritura pública e os atos
de mera administração ou conservação dos bens hereditários, incluindo a
ocupação, a habitação e proposição de medidas judiciais em defesa do
patrimônio, praticados pelo eventual herdeiro, não implicam aceitação tácita da
herança.Por fim, o artigo 1.864 parece afastar a possibilidade de
testamento on-line, pelo e-notariado, representando aparente incongruência com
atual de compatibilização entre direito e tecnologia.Por outro lado, inova em institutos inserindo definições e
categorias subjetivas, as quais certamente implicarão em possível incremento no
volume de demandas judiciais, o que é sobremodo indesejável. Neste contexto,
resta aguardarmos a aprovação do texto final.Fonte: IBDFAM